O Livro “Adoráveis Mulheres” é um clássico da literatura Norte-americana de 1868 e foi escrito por Louisa May Alcott, sendo semi-biográfico. Ela conta a história de quatro irmãs, Jo, Amy, Meg e Beth March, e suas aspirações durante a infância e adolescência, e seus feitos ao se tornarem adultas. Já foram feitas diversas adaptações desde o início do cinema na década de 1910, até sua última em uma minissérie de 2017. Agora foi a vez de Greta Gerwig (Lady Bird: É Hora de Voar) entregar a sua versão.

Não adentrarei no aspecto de fidelidade da adaptação que Gerwig, ou comparar com as outras versões. Tentarei explicar como ela consegue entregar um filme tão atual de um livro de mais de 160 anos. É uma obra que beira a perfeição, desde o roteiro até a escolha de figurinos, mas principalmente pelas atuações e a evolução rápida de Greta Gerwig com diretora e sua coragem na hora de escolher como contar essa história.

A escolha do elenco é algo fenomenal, em um ano que tivemos filmes com elencos recheados de estrelas que possuem 10, 20, 30 ou mais anos de carreira, este elenco jovem não perde em nada. Saoirse Ronan como Jo, Emma Watson como Meg, Florence Pugh como Amy, Eliza Scanlen como Beth e Timothée Chalamet como Laurie, são atores novos, mas bem conhecidos em Hollywood e aqui entregam um trabalho fenomenal, que te faz esquecer outros nomes poderosos do elenco, como Laura Dern, Chris Cooper e Meryl Streep(!!!).

O texto de Gerwig facilita o trabalho dos atores, recheado de diálogos simples, mas com um subtexto extremamente poderoso que só funciona graças as atuações. Saoirse Ronan é uma força da natureza, qualquer coisa que lhe for entregue é certeza de uma interpretação absurda. Aqui não foge a regra, ela consegue ser corajosa, mas sensível, determinada e receosa, consegue transitar entre emoções com uma fluidez única. A irlandesa é uma das melhores atrizes da atualidade, e com certeza a primeira da fila na hora de suceder Meryl Streep como uma das maiores da história do cinema.

Emma Watson e Eliza Scanlen entregam atuações incríveis, mas extremamente delicadas, muito por causa de suas personagens. Watson com a sutileza e sensibilidade de Meg, ela some dentro da personagem, entregando algo único em sua carreira. Enquanto Scanlen, representa a pureza e inocência máxima em sua Beth, ao mesmo tempo que é a personagem mais sofre ao ver o crescimento e evolução das irmãs. Ela é a que possui menos foco e tempo de tela, mas sem deixar de ter a mesma importância dos outros. Portanto, preste atenção nos cantos, fique de olho nas cenas que ela está presente, ela é o termômetro do filme, por ela você percebe qual será o humor da cena, seja feliz ou triste.

As duas estrelas do filme são Florence Pugh e Timothée Chalamet. Enquanto a primeira é algo fora do normal, principalmente por alternar momentos cômicos e tristes sem parecer piegas, além de ser a que apresenta maior mudança da infância pra vida adulta, Chalamet é o charme, a inocência, a simples alegria de estar ao lado das garotas. Os dois interpretam os personagens que mais mudam durante o filme, e conseguem demonstrar isso com simples gestos, olhares, forma como se portam nas cenas. Pugh é um nome para se acompanhar desde seu último sucesso “Midsommar”, e Chalamet, ao lado de Ronan, são os nomes que ditam essa renovação em Hollywood.

Greta Gerwig e seu filme tecnicamente perfeito

 Diretora Greta Gerwig e o diretor de fotografia Yorick Le Saux

Indo para as partes técnicas, Gerwig não erra em absolutamente nada em suas escolhas. Começando por Alexandre Desplat e sua trilha sonora fenomenal como de costume. O compositor que costuma utilizar a música tradicional como base, aqui acrescenta lúdicos a ela, que dita o tom sonhador das protagonistas e dita o ritmo do filme. É uma trilha bonita e sutil, com toques de melancolia quando lhe é necessário, e algo que se destaca no filme, sendo mais um personagem, um casamento perfeito.

O visual é exuberante. A montagem dos cenários, os figurinos, que receberam uma consultoria voluntária de Steven Spielberg, disse Greta Gerwig em uma entrevista, são lindos e ricos em detalhes. É um filme que se passa durante a guerra civil americana e possui toda a pompa dos figurinos de época, mas sem parecer cafona, e você consegue se ver usando algum daqueles vestidos e ternos.

Dentro do visual, o principal ponto, que beira a genialidade, é a escolha de diferentes fotografias para as duas linhas do tempo. Greta constrói o filme mostrando a vida adulta das garotas com cenas de flashback enquanto a história anda. Para ajudar na montagem e criação desta história, ela usa uma fotografia mais quente nas cenas da infância, e uma extremamente fria na fase adulta, com exceção de um certo momento do filme (você perceberá a mudança). Ele utiliza esse recurso para nos dizer e nos fazer relembrar que durante a infância a vida é mais alegre e sem muitos problemas, muitas vezes, o contrário de quando nos tornamos adultos. Principalmente na vida das garotas essa mudança é nítida, para bem ou para o mal.

Esta escolha de contar a história por duas linhas do tempo que vão se alternando é o que torna o filme tão agradável. Ele vai te mostrando a “vida atual” dos protagonistas e colocando situações passadas que são parecidas com as quais eles estão vivendo. Explicando como elas chegaram até ali. Além disso, ela consegue esconder personagens e revelações, mesmo contando a história a partir de um ponto futuro, e consegue surpreender de uma forma tão sofisticada, sem questionar a inteligência do espectador.

A evolução da direção de Greta Gewig é impressionante, principalmente no uso da câmera. “Lady Bird” era um filme mais estático, ela deixava muito por conta dos atores levarem a trama. Aqui, a câmera está em constante movimento, principalmente acompanhado Jo, e ela utiliza isso para mostrar que a personagem nunca para, está em constante evolução. Ela faz isso para quase todas as protagonistas, sabendo intercalar com momentos em que a câmera precisa ficar parada. Além de se preocupar com o minimalismo de algumas tomadas, focos em objetos, gestos, expressões que poderia passar despercebidos, ela faz questão de nos mostrar.

O principal tema que Greta Gerwig aborda no filme é que somos independentes para fazermos as escolhas que bem entendermos, mas precisamos aceitar as consequências. O filme conversa mais com o público feminino, envolvendo questões sobre aceitar as coisas que a sociedade impõe, principalmente por ser regida de ideias machistas. O filme consegue traçar um paralelo com o mundo atual mesmo se passando no século XIX, levantando questões que nos permeiam, principalmente as mulheres.

“Adoráveis Mulheres” é sobre ter seu pensamento próprio, buscar sua felicidade independente de onde ela esteja, não se contentar com migalhas, mas saber que tudo que você faz gera consequências, sendo boas ou ruins. É um filme para reforçar a causa feminista e enfatizar o empoderamento das mulheres, independente da idade. Enquanto para os homens, é para valorizar e respeitar as mulheres, e aceitar suas escolhas, e o principal, incentivar ao invés de silenciar. Greta Gerwig mostra como atualizar um clássico sem perder a sua essência, e cria um novo clássico instantâneo.

“Eu quero ser grande, ou nada” Amy March

Nota: 5/5

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